Ela ficou sem falar por 12 anos, sendo considerada uma bruxa, amaldiçoada e até louca. Isso tudo por causa de uma moedinha, presa em sua garganta. Teve uma adolescência difícil, juventude ainda mais, porém conseguiu se restabelecer.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a aspiração de corpos estranhos acontece geralmente entre 1 e 3 anos de idade e nem sempre são identificadas logo. “Logo após a aspiração de algum objeto, ocorre acesso de tosse, seguida de engasgo, que pode ou não ser valorizado pelos pais”, sendo necessários outros sintomas para dar mais atenção.
Porém, e se isso não acontecer e o corpo estranho simplesmente se alojar em algum local pouco incômodo? Foi exatamente o que aconteceu com Marie McCreadie, que perdeu a sua voz aos 13 anos, sem causa aparente. O caso aconteceu na década de 70, na jovem Austrália, com menos de 100 anos de federação e 200 de colonização europeia.
Sem falar, sem amigos ou família
Marie era uma menina comunicativa, no auge dos seus 13 anos, quando se mudou do Reino Unido para a Austrália. Saindo do inverno rigoroso para o calor e luminosidade do verão australiano, ela se sentia em plenas férias. Aproveitou bastante o período, porém teve que dar uma pausa para cuidar da saúde.
Ela acordou com muita dor de garganta, sintomas de gripe e começou a cuidar como tal, porém o quadro logo evoluiu para uma bronquite. Foi quase um mês de tratamento, porém sua voz – que sumiu com a inflamação na garganta – não voltava. Ela achou que era uma questão de tempo, mas as semanas se passavam e nada acontecia.
No hospital, diagnosticaram como laringite e o tratamento não funcionou. Afirmaram então que era uma mudez histérica, ou seja, ela não queria, inconscientemente, falar. A notícia logo se espalhou e a freira responsável pela disciplina no internato que Marie estudava decidiu dizer que era falta de confissão.
Mas a menina não tinha nada para confessar! Foi então proibida de entrar na igreja, sendo considerada uma bruxa, demoníaca. Aos 14 anos, ela tentou tirar a própria vida e foi internada, primeiro no hospital comum e depois em outro psiquiátrico.
Não tinha amigos, família – que a considerava uma vergonha e um peso – menos ainda, sua voz. No hospital psiquiátrico, teve que lidar com todos os tipos, sendo levada inclusive para ter sessões de eletrochoque. Depois disso, ela conseguiu fugir e foi para a casa da família, que a acolheu, porém sem muito entusiasmo.
A reconstrução
Vendo que sua situação não mudaria e que não poderia confiar em ninguém, começou a estudar linguagem de sinais, datilografia e voltou a estudar. Trabalhava também no café que a família mantinha, preparando os alimentos. Porém, aos 25 anos, já acostumada com a nova vida, ela começou a sentir muita dor na garganta.
Começou a tossir e, em meio a isso tudo, começou a sair sangue de sua boca. Ela foi levada para o hospital, onde os médicos analisaram o seu caso. Um deles percebeu que havia algo na garganta e conseguiu retirar com uma pinça especial. Estava coberto de muco, sangue e outras secreções. Quando limparam, perceberam que se tratava de uma moeda.
Imediatamente, Marie pôde emitir sons – nada parecido com a fala, pois ela perdeu a prática – mas definitivamente era a sua voz novamente. Todos ficaram em choque, inclusive a equipe médica, pois foram 12 anos sem poder falar, por causa de algo tão simples. A moeda estava localizada ao lado das cordas vocais, impedindo que elas vibrassem e emitissem qualquer som.
Marie conta sua história no livro Voicelles, que pode ser traduzido para “Sem voz”, em português, e ainda guarda a moeda, agora em forma de pulseira, para se lembrar de nunca perder a voz.