D. Maria II nasceu no Brasil, em 1819 e, de um momento para o outro, se viu na missão de governar Portugal. Mas essa não era sua única tarefa diária. A rainha foi capaz de governar um país e uma casa com sete filhos com a mesma maestria, tal como fazem hoje muitas mulheres empoderadas. Então, como seria a casa de D. Maria II se ela vivesse em 2021?
Esse é mais um artigo da série Três Reis e Uma Rainha, criado pelo Imovirtual em parceria com o investigador e historiador português João Ferreira, autor de vários livros sobre a monarquia portuguesa.
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É difícil não colocar a maternidade no topo da história desta rainha, porque ela não foi “apenas” mãe. D. Maria II viveu e morreu pelos filhos. No dia em que foi avisada para o risco de tantos partos, disse: “Se morrer, morro no meu posto”. Assim foi.
Dos 18 anos até aos 34 anos, D. Maria II passou por 12 partos. Destes, foram 7 filhos que sobreviveram. No último, ela não resistiu. Embora tivesse sido alertada sobre o perigo de tantos partos para a época, ela continuava a engravidar. Nos últimos quatro partos, os bebês nasceram mortos.
Numa carta citada no livro “D. Maria II – Tudo por um Reino”, de Isabel Stilwell, D. Fernando II, o marido, escreve que não foi o sofrimento e as dores que mataram a esposa, mas a fadiga e a fraqueza: “Creio que os seus numerosos partos enfraqueceram de tal forma o seu organismo que já não sentia nem mesmo contrações fortes e dolorosas”.
Fernando II escrevia consternado à rainha Vitória, amiga e confidente de D. Maria II, para lhe dar a notícia da morte da mulher:
“O que tu não sabes, minha querida Vitória, era ao ponto que eu e ela éramos ligados. Estes grandes afetos, quando são estilhaçados, deixam uma vida triste e uma dor difícil de curar. Tenho os meus filhos, que amo tanto, e que são tão bonitos e bons, mas uma mulher que nos ama, nada pode substituir”.
Filha de D. Pedro I do Brasil e irmã de D. Pedro II, Maria da Glória Joana Carlota Leopoldina da Cruz Francisca Xavier de Paula Isidora Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga (esse é o nome completo da rainha), teve uma vida como o seu reinado: curta, mas intensa.
Maria da Glória nasceu no Palácio de São Cristóvão, no coração do Rio de Janeiro, de onde jamais poderia imaginar que sairia para governar um país do outro lado do Atlântico. Até os oito anos ela teve uma infância despreocupada, até que chegou à Baía da Guanabara a notícia da morte do avô, D. João VI, lá em Portugal, que lhe mudou irremediavelmente a vida.
Apesar disso, ao contrário do que parecem sugerir seus últimos anos de sofrimento, a vida de Maria da Glória no século 21 seria tudo menos infeliz, pois ela teria tempo de educar com primor sete filhos, inclusive com a colaboração do marido, que tanto amava a família.
Certamente, nos dias atuais os 12 filhos de Maria da Glória teriam sobrevivido com a ajuda da medicina. As gestações teriam sido mais tranquilas e ela iria aproveitar bons momentos de passeios à beira-mar na orla do Rio de Janeiro, sua amada cidade-natal.
Mas, voltando ao século 19, a história de D. Maria II muda quando o pai D. Pedro I é obrigado a deixar o Brasil e voltar a Portugal. Nessa época, com apenas 7 anos de idade, Maria foi obrigada a se casar com o tio, D. Miguel, claro que por motivos de manter o reinado na família, o que durou apenas 2 anos. Aos 9, ela já estava no seu primeiro divórcio. Os tempos eram realmente outros!
Só aos 15 anos, quando o pai já tinha vencido a guerra, é que Maria pisa solo português, já pronta para governar. Foi uma situação totalmente incomum, pois estava uma mulher a comandar um país onde as mulheres não podiam votar.
Havia outra novidade: Portugal tinha uma constituição, que vinha de 1822, e a rainha teria de governar com ela. “Não havia histórico de como se governava um país com uma constituição, mas havia uma coisa que se sabia: a rainha tinha que dar herdeiros, não podia haver falhas”, conta João Ferreira.
Foi aí que Maria se viu obrigada a se casar pela segunda vez e começar a ter filhos. A primeira tentativa de casamento foi com Augusto de Beauharnais, outro quase-tio, já que Augusto era irmão da madrasta de Maria, Amélia. O casamento não durou nem dois meses, porque o príncipe morreu.
Quando fez 16 anos, Maria da Glória partiu para o seu terceiro e último casamento, com o homem que foi pai de todos os seus filhos: Ferdinand August, austríaco de nascença, se tornou o rei-consorte (que significa, marido da monarca) Fernando II de Portugal.
Depois de um dos períodos mais violentos da história de Portugal, o que fica dos 19 anos do seu reinado é a pacificação do país, e o desenvolvimento que D. Maria II conseguiu em áreas políticas, econômicas e na educação.
Em seu tempo de reinado o ensino primário se tornou gratuito. Quando comemorou 27 anos de vida, ela inaugurou o Teatro Nacional D. Maria II, até hoje um dos principais centros culturais do país. Aproveite e conheça as casas que estão à venda próximas ao Teatro, em Lisboa.
Conhecida como A Educadora, a Maria do século 21 lutaria pelas suas bandeiras de sempre: a educação para todos, as problemáticas femininas, o amor pela cultura e pelo teatro. No seu quarto cabem referências a Lisboa, aos filhos e a uma vida pessoal e profissional bem agitada.
Orgulhosa das raízes cariocas, sem medo dos rótulos, Maria da Glória guardaria em casa alguns dos seus melhores retratos. Um pouco como aquele que em 1967 entrou em circulação na nota de mil escudos em Portugal, onde Maria aparece jovem, de cabelo apanhado e olhar sorridente.
Esse texto foi originalmente publicado no Imovirtual. Se você quiser ler a história completa e de outros monarcas, acesse Imovirtual.